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A América Dividida - I

HEITOR DE PAOLA - MÍDIA SEM MÁSCARA - 7 DE JANEIRO DE 2005


Uma pesquisa realizada pelo pool USATODAY/CNN/GALLUP duas semanas após as últimas eleições americanas, mostrou que 65% dos americanos acreditam que o País está ‘muito dividido’ sobre os valores morais e 72% disseram que ‘nunca antes a divisão foi tão grande’. Jeff Jones, analista da Gallup, acredita que isto se deve ao fim da quase unanimidade causada pelos ataques terroristas de 11 de setembro. A intensidade dos sentimentos em relação a Bush está no auge, pois Bush é o Presidente mais polarizador desde Johnson, em plena guerra do Vietnã.



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Os comunistas devem se preparar para usar todo tipo de estratagema para evitar e esconder a verdade (...) A parte prática da política comunista é a de incitar um inimigo contra o outro (...) não corrigir seus erros, mas romper as hostes inimigas, evocando as piores suspeitas e pensamentos entre eles. Vladimir Ilich Lênin

Desde as eleições Bush tem aprofundado sua agenda política interna, enfatizando o corte de impostos, que deseja tornar permanente, e a reforma da previdência social estatal no sentido de dar aos trabalhadores o direito de investir parte de sua poupança – ambas prioridades para os conservadores, mas às quais se opõem os Democratas e parte dos Republicanos. 2/3 do total dos entrevistados prefere que o Presidente busque um consenso bipartidário. Até mesmo os que se declaram Republicanos dividiram-se ao meio neste item: 46% a 46%. Mesmo assim, mostraram-se mais favoráveis ao Presidente e menos pessimistas em relação à situação da guerra do Iraque.

Chegou-se a falar de uma divisão radical entre estados azuis, predominantes nas duas costas e vermelhos centrais, divulgou-se uma falsa emigração em massa de americanos para o Canadá e psicoterapeutas oportunistas inventaram um ‘surto de depressão coletiva’ nos estados azuis. Alguns analistas políticos chegaram a discretamente avaliar possibilidades de uma nova secessão e guerra civil. Para um entendimento mais profundo das raízes desta divisão é necessário recuar alguns anos no passado e deslocar-se para o leste. *** Nos últimos anos da era stalinista instalou-se uma crise no governo soviético, no partido comunista e na ideologia – internamente e no mundo todo. Economia e agricultura em ruínas, poder total da polícia política. Anti-semitismo declarado. Guerrilhas nacionalistas. Crise iugoslava. Reações contra o comunismo no Ocidente. A resposta de Stalin foi mais terror e repressão em massa. Stalin exercia o poder total: sobre o Partido e sobre o Estado. Após sua morte em 1953, estes poderes foram divididos: Nikita Kruschëv assume a chefia do Partido – como Primeiro Secretário - e durante os quatro anos seguintes, estabeleceu-se uma intensa luta pelo poder do Estado, com os governos de Zhdanov, Beria e Malenkov se sucedendo. Em 1956 Kruschëv denuncia os crimes de Stalin em reunião “secreta” no XX Congresso e no ano seguinte elimina o grupo Malenkov-Bulganin-Molotov e assume o poder total. Em 1958, para tentar reverter a tendência de desintegração do bloco soviético, foi criado o Departamento de Operações Ativas do Comitê Central e indicado para dirigí-lo Alieksandr Shieliepin que apresenta um extenso relatório criticando o KGB (Comitê de Segurança do Estado), por não ser capaz de influenciar a opinião da população em favor do regime e não evitar o crescimento de tendências anticomunistas no mundo. Como resultado das discussões, foi formulada uma nova estratégia de longo prazo para restabelecer o objetivo comunista de sempre: o domínio mundial. Uma política difere essencialmente de uma estratégia, pelo fato de que a primeira tem objetivos claros e explícitos; uma estratégia tem objetivos secretos enquanto se alardeiam falsos objetivos que servem para conquistar corações e mentes. Estas são as duas características que os ocidentais têm sido incapazes de perceber: o caráter essencialmente secreto do regime comunista e a desinformação (em russo desinformatsiya), a disseminação de informações falsas e provocativas. As operações de desinformação diferem da propaganda convencional, por esconderem suas origens e objetivos reais, e envolvem ações clandestinas que incluem a distribuição de documentos, cartas, memorandos forjados e a propagação de rumores maliciosos. Cria-se a agência de propaganda Novostyi que ao contrário da TASS não se dedicava às notícias e desinformação, mas somente ao último propósito. Em 1958 Shieliepin é nomeado Diretor do KGB e cria o Departamento D (de Desinformatsiya) que aprofundou a estratégia já formulada por Lênin na década de 20: o padrão ‘fraqueza e evolução’ que consiste em subestimar publicamente o poder comunista e aplacar os temores de seus adversários, por meio da criação de falsas crises internas e divulgação de fraquezas e dissidências no mundo comunista, publicando as más notícias e retendo as boas. Foi minuciosamente estudada a aplicação por Lênin, da Nova Política Econômica, para atrair capital ocidental que financiasse o desenvolvimento soviético. Em 1960 realiza-se em Moscou o Congresso dos Oitenta e Um Partidos Comunistas. Foi elaborada a Grande Estratégia de longo prazo – eventualmente denominada Perestroika - com objetivos mundiais a se desdobrarem em etapas sucessivas, cujo timing dependeria das ocorrências do mundo real (das ‘condições objetivas’, em linguagem leninista). Interessa-nos aqui somente o que se refere aos Estados Unidos de América, deixando o restante para uma série de artigos sobre a Perestroika a ser brevemente publicada.

*** Perestroika pode ser traduzida por ‘re-estruturação’, porém a fase da re-estruturação interna foi sendo preparada secretamente até chegar a Gorbachëv. Enquanto isto, foram tomadas medidas para re-estruturar a visão que o mundo ocidental tinha sobre os países comunistas, o verdadeiro sentido de perestroika. A primeira tarefa era agir em bloco, mas criar a ilusão de falsos conflitos entre os países comunistas, como foi o “conflito Sino-Soviético”, acertado secretamente entre Kruschëv e Mao. O termo “ditadura do proletariado” foi oficialmente abandonado e, mais tarde, substituído por “governo de todos”. Em segundo lugar, era necessário criar uma base segura de operações o mais próximo possível dos EUA, e Cuba – comunista desde 59 e participante do Congresso dos 81 – era o local ideal. O que ocorreu poderia servir para um estudo de caso de como a desinformação funciona: a presença de mísseis russos em Cuba. Sabedor da absoluta superioridade tecnológica americana, Kruschëv jamais cogitou pôr mísseis lá para atacar os EUA. Causariam poucos danos, enquanto a retaliação seria o fim da URSS. Já naquela época a superioridade tecnológica americana era insuperável. Ao mesmo tempo, através de agentes infiltrados na CIA sabia que Kennedy jamais permitiria a permanência dos mesmos lá. O objetivo era, pois, bem outro e foi conseguido com maestria. Com o bloqueio e a exigência de retirada Kruschëv exigiu uma contra-partida, que era o único objetivo verdadeiro: que os EUA assinassem um tratado garantindo que jamais iriam intervir em Cuba, documento até hoje respeitado. Pronto: a base seguríssima de operações na América Latina estava conseguida com a garantia americana. E os americanos – e o mundo todo – se sentiram vitoriosos! A terceira, já diretamente destinada a provocar uma divisão interna nos EUA, foi engajar os americanos numa guerra impopular, o que foi facilmente conseguido com a ameaça de invasão do Vietnã do Sul, país garantido pelos EUA após a derrota francesa em Dien Bin Phu, pelo Norte e a criação de uma guerrilha interna no Sul, o Vietcong. Como o Congresso americano jamais concedeu a Johnson e depois a Nixon autorização para declaração de guerra formal ao Vietnã do Norte, as Forças Armadas americanas – que teriam fácil e rapidamente ganho a guerra – ficaram chafurdando na lama e acabaram se retirando, numa aparente vitória de pés-rapados sobre a mais poderosa força até então existente. Ao mesmo tempo foram explorados os escrúpulos da opinião pública Ocidental em atacar civis, fazendo o recomendado por Mao: o guerrilheiro é o peixe e o povo a água; um peixe não vive fora d’água! Entenda-se: misturem-se ao povo e não serão atacados pelos estúpidos americanos. O sucesso foi tão grande que se transformou no modelo a ser usado em todo mundo: quem não lembra de como proliferaram os exércitos de libertação nacional? A história real, secreta, foi bem outra. Foi mobilizada a antiga rede de agentes infiltrados, companheiros de viagem e idiotas úteis no interior dos EUA para criar uma cunha que dividisse o povo americano. Esta infiltração se dera principalmente nos setores culturais e na mídia pela brilhante atuação de Willi Münzenberg, a serviço do KOMINTERN (Internacional Comunista), no período entre guerras. Para atrair a intelectualidade americana e mundial era preciso criar a falsa ilusão de uma ‘humanização’ do regime. Para isto serviu o ‘vazamento’ da denúncia dos crimes de Stalin e se iniciou a “desestalinização” – que não passou de um retorno aos ensinamentos de Lênin, e o Ocidente mais uma vez acreditou que era para valer. Inventaram-se até mesmo falsas dissidências internas no bloco e uma falsa oposição dentro da própria URSS. Estes ‘dissidentes’ democratas entraram em contato com a intelectualidade ocidental dando a impressão de haver convergência de valores e planos. Iugoslávia e Romênia, aparentemente rompidas, atraíam o Ocidente. A falsa ruptura com a China permitiu um movimento de pinça em que a URSS posava de socialismo com face humana e a China de demônio. Mas os mesmo objetivos eram mantidos.

A CONSTRUÇÃO DE UM “DISSIDENTE”

Era preciso estimular o triunfalismo de que a guerra fria terminara com a vitória expressiva do Ocidente. O reconhecimento da ‘derrota’ da URSS visava o desarmamento dos EUA, pois, se não há inimigos a combater?! A desestabilização do complexo industrial militar americano era o alvo desta farsa – na qual até hoje meio mundo acredita porque a sensação quase tóxica de ser vitorioso é boa demais para ser abandonada, em função dos avisos de paranóicos que querem estragar a festa de todos! Entrava-se na fase da Perestroika propriamente dita e da glasnost (transparência), já preparadas desde 1958. Esta última consistiu numa abertura seletiva e controlada dos “arquivos de Moscou”, deixando vazar documentos que eram do interesse do KGB para implementar a estratégia leninista de um passo atrás, dois à frente. Previa-se o novo fechamento assim que os objetivos fossem alcançados, o que Putin fez há pouco. Mas de nada adiantava enfraquecer militarmente a América sem continuar o trabalho anterior de arregimentação interna, pois para conseguir a divisão do País, era preciso minar ainda mais a confiança do povo americano nas suas Instituições, no sistema democrático e federativo, no american way of life (alvo de intensos ataques da esquerda hollywoodiana), e nas crenças religiosas e os fundamentos morais. E a substituição da velha liderança soviética representada por Brejniev, Andropov, Chiernienko, por um líder ocidentalizado, com uma bela esposa muito parecida com as American first ladies. A preparação para isto deveu-se, entre outras coisas, aos inestimáveis serviços prestados pelo maior agente de influência da KGB no Ocidente: Andrei Sakharov, o “pai da bomba H”, físico respeitado internacionalmente. Já em 1967, num manifesto ao mundo e apresentando-se como porta-voz de uma secretamente controlada “dissidência”, Sakharov divulgava suas “predições”, integralmente ditadas pelo KGB: a) Vitória dos “realistas” e reformas econômicas e democráticas; b) Vitória dos reformistas de esquerda contra o racismo e o militarismo; c) Necessidade de reverter o quadro após a vitória americana, reforçando a posição dos aliados social-democratas (nos EUA chamados “liberais”) para cooperação USA-URSS sobre desarmamento e ajuda ao 3o Mundo; d) Re-estruturação política e econômica dos dois lados para atingir uma desejável ‘convergência’ entre os sistemas– em russo sblizhenie - a essência do futuro governo mundial: o democratismo, um governo comunista com aparência de democracia. Para reforçar o mito do dissidente confiável era preciso uma peça genial de desinformação: o “exílio” de Sakahrov para Gorki, em 1980. Aí todas as dúvidas “paranóicas” de dissiparam, choveram manifestos, preparados pelo KGB, de protestos contra este tratamento ignóbil a um dissidente tão ilustre, que “conseguiu ludibriar a censura soviética” enviando uma carta a Carter onde introduzia o ponto de vista dos “dissidentes” sobre direitos humanos, obviamente os ditos “direitos sociais”. Manifestos, manifestações, mesas-redondas e outros, “contra a guerra e pela paz” proliferaram. E o Ocidente continuou acreditando na farsa – como hoje muitos se deixam iludir pelos suposto assassinato de familiares de Deng Xiaoping e a “abertura” chinesa – mesmo quando, na posse de Gorbachëv, Sakharov foi nomeado seu principal assessor para a Perestroika! Além do papel ativo de Sakharov como elo de ligação entre os “liberais” americanos e seus falsos correspondentes soviéticos, foram de fundamental importância: 1- Encontro entre Gorbachëv e assessores com membros selecionados da elite americana na sua primeira viagem a Washington; 2- Campanha permanente da Embaixada Soviética; pela primeira vez um Embaixador, Anatoliy Dobrynin, era o próprio rezidient do KGB; 3- Uso permanente da Rezidientura do KGB nos USA; 4- Avalanche de convites para viagens a Moscou e cooperação internacional.



 
Heitor De Paola MSM, em 07 de janeiro de 2005
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