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Vozes D'África

HEITOR DE PAOLA - MÍDIA SEM MÁSCARA - 27 DE DEZEMBRO, 2005


Se há uma razão para esperança na África certamente não vem da loucura ocidental de jogar dinheiro fora, mas da ação de nativos que clamam ao mundo para que aprendam as dolorosas lições derivadas das políticas passadas.

People are starving in Niger - and in Zambia, Zimbabwe, Ethiopia and else in Africa - but not because of free markets. Rather, they are starving because of the lack of markets and their underlying institutions: property rights, the rule of law and limited government. Thompson Ayodele

Introdução e Tradução de Heitor De Paola Thompson Ayodele é diretor do Initiative for Public Policy Analysis (IPPA) em Lagos, Nigéria e é uma das mais sonoras vozes da nova África. De lá nos chega ultimamente a verdadeira cultura negra, a dos negros cultos - não a dos atabaques, dos quilombos, do funk e das feitiçarias que os “movimentos negros” tentam nos impingir como cultura. Felizmente também não mais o clamor pungente e desesperado de que nos falava Castro Alves em seus poemas Vozes D’África e Navio Negreiro. O Continente Negro está muito atrasado em diversos aspectos em relação ao resto do mundo mas não no terreno intelectual, que deixa a falsa intelectualidade latino-americana – principalmente o deserto intelectual brasileiro – muito para trás. Pelo passado colonial a África, no século XX, contou com intelectuais de escol, formados nas metrópoles que, embora em reduzido número, sempre se sobressaíram. Infelizmente, por um imenso rancor não de todo injustificado contra os colonizadores, a primeira geração de intelectuais africanos dos tempos pós-coloniais foi presa fácil da charlatanice marxista que se lhes apresentava como a defesa dos “oprimidos”. As falácias leninistas sobre o colonialismo como máxima expressão do imperialismo capitalista, uma idiotice sem tamanho, predominante nas universidades européias, encheu a cabeça dos estudantes africanos com a necessidade de “superar o capitalismo” e estabelecer o socialismo como forma de descolonização. Só não contaram o pulo do gato: era tudo mera retórica estratégica soviética – e, em menor, grau, maoísta – para dominar as recém criadas nações livres. Assim, Kwame Nkhruma, Julius Nyerere, Kenneth Kaunda, Jomo Kennyatta, Samora Machel e tantos outros caíram no maior conto do vigário do século XX! Tomar conhecimento do embuste e tentar revertê-lo foi um processo lento e penoso mas a nova geração de intelectuais negros fala uma outra linguagem. Tenho dúvidas se a intelectualidade latino-americana conseguirá fazer o mesmo a tempo de evitar a dominação comunista dos seus patrões - dos Castros, Chávez, Lulas, Morales, Tabarés e tutti quanti. Passo a palavra para o Dr Lawrence Reed, Presidente do Mackinack Center for Public Policy, um instituto educacional e de pesquisa com sede em Midland, Virginia. O seu artigo, que traduzo adiante, saiu publicado na Newsletter do IPPA de 8 de dezembro de 2005. *** OS AFRICANOS EM QUEM OS OCIDENTAIS DEVERIAM PRESTAR ATENÇÃ Dr Lawrence Reed Na reunião de cúpula do G-8 no último mês de julho, na Escócia, políticos europeus e norte-americanos (todos eles brancos) choraram lágrimas de crocodilo pela penosa situação dos negros africanos. Fazendo eco ao grasnar histriônico de atores, astros de rock, ideólogos socialistas, ditadores do Terceiro Mundo e outros “grandes especialistas” em desenvolvimento, clamaram por mais uma transferência de recursos das nações desenvolvidas para as subdesenvolvidas da África – critério que parecia não excluir nenhum país do continente. Os líderes do G-8 querem que os governos aumentem dramaticamente o nível de ajuda econômica para a África e perdoem as dívidas acumuladas pelos antigos regimes africanos. A magnitude dos subsídios propostos dá novo significado à frase “jogar dinheiro pelo ralo”, geralmente usada em tom pejorativo. Liderança ousada e imaginativa? Novas soluções criativas para problemas intratáveis? Dificilmente. É mais mera pose política, desculpa para viagens dispendiosas e ignorância da realidade e da economia. A resposta coletiva de pessoas que pensam seria mostrar aos africanos o que fazer por eles mesmos. Na verdade, esta é a reposta de um número crescente de pessoas na própria África. Não dos governos africanos, claro, que só esperam a ajuda externa escorregar entre seus dedos para chegar a conta-gotas na boca dos famintos cidadãos por eles oprimidos. Certamente não os ricos showmen, como Bono, que lá ficam uns poucos dias e que acham que “sentiram a África” por se aventurarem a sair de um hotel cinco estrelas com uma câmera digital. Estou me referindo aos africanos nativos que são os primeiros a ver o que a ajuda estrangeira tem feito aos seus países, que entendem o que realmente deve ser feito para que um país subdesenvolvido se desenvolva, e que estão escrevendo e falando com uma coragem e erudição que desafia o falido status quo. Um deles é o ex-professor primário James Shikwati, do Kênia. Com 34 anos fez furor tanto na Europa quanto na África, com uma entrevista publicada em julho pelo periódico alemão Der Spiegel. “Pelo amor de Deus, parem por favor, parem com a ajuda!”, clamava a manchete. Shikwati argumentou que bilhões em ajuda passada somente alimentaram bem nutridas burocracias, estimularam a corrupção e a complacência. Pior, enfraqueceu os fazendeiros e empresários locais que não conseguem competir com a ajuda estrangeira gratuita. “Se as nações industrializadas querem realmente ajudar a África, devem acabar imediatamente com esta ajuda indecente”, declarou. O think tank de Shikwati, o Inter-Region Economic Network estimula a educação para o livre mercado. Patrocina seminários no leste da África focados no treinamento para desenvolver seus próprios talentos empresariais e se opor às políticas governamentais que impedem seu desenvolvimento. Shikwati acredita que não haverá desenvolvimento algum enquanto um grande número de africanos, encorajados por ocidentais estatistas, olharem para si mesmos como vítimas e mendigos. Ao invés de agirem “como uma criança esperando a babá”, diz ele, a África “deveria se levantar e se sustentar por seus próprios pés”. Leon Louw, da África do Sul, não estava só quando disse coisas parecidas já na década de 70. Neste ano comemora-se o trigésimo aniversário de sua Free Market Foundation em Johannesburg e Capetown. Ele pode comemorá-lo com a certeza de que grupos como o seu e o de Shikwati proliferam na África de hoje – em sintonia com os africanos comuns quando dissecam as políticas governamentais, tanto em seus países, como em todo o mundo. O “debate” político deixou de ser uma litania de prescrições socialistas e de bem estar social, mas foi revivido pela saudável discussão fundada no respeito à lei e à livre empresa. Na nação mais populosa da África, Nigéria, a crítica à ajuda ocidental ecoa na voz do jornalista Thompson Ayodele. Como fundador e dirigente do Initiave for Public Policy Analysis, Ayodele observa que “de 1970 a 2000 a África recebeu em torno de $400 bilhões de dólares em ajuda ocidental. A África recebeu suficiente ajuda dos outros países. Mas se alguém quiser realmente ajudar os africanos pobres a saírem do círculo vicioso de pobreza, deveria estimular o livre comércio, proteger os direitos de propriedade, encorajar a abertura comercial, permitir o florescimento do mercado e reduzir a intervenção governamental na economia”. Ayodele não quer o dinheiro de Tony Blair mas sim uma reversão da política do mesmo. “O Primeiro Ministro Blair deveria ter o mesmo zelo e compromisso que hoje devota ao promover a ajuda externa e ao cancelamento dos débitos, para acabar com os subsídios que distorcem as trocas comerciais e as tarifas que totalizam $1 bilhão de dólares por dia. Abolir essas políticas faria muito mais para melhorar a vida de milhões de pessoas abatidas pela pobreza na África do que qualquer quantia em ajuda estrangeira”. Por piores que sejam as barreiras impostas pelos países de fora da África, estas nem chegam perto das barreiras que os governos africanos aplicam entre si. A tarifa média entre os países africanos, segundo o FMI, é 50% maior que no resto do mundo. Números do Banco Mundial indicam que enquanto as nações sub-saharianas conseguem, na compra de commodities agrícolas da Europa, a tarifa média de 19%, elas sobrecarregam seus vizinhos com incríveis 33.6%. Não é por nada que as mercadorias ficam encalhadas nestes países por tempo três vezes maior do que na Europa ocidental. Durante décadas kenianos podiam comprar alimentos da Inglaterra por menos do que conseguiam da vizinha Uganda. Defensores do livre mercado, como Shikwati, imaginam como os kenianos viveriam melhor se eliminassem suas próprias tarifas e comprassem diretamente de Uganda, evitando ainda o custo dos intermediários ingleses. Finalmente, em janeiro de 2005, o livre comércio conseguiu um tento quando vários países da África Oriental assinaram um protocolo alfandegário conjunto que reduziu ou até mesmo eliminou inúmeras tarifas. A liberdade comercial entre os países africanos é um tema permanente de um dos mais novos think tanks do continente, conhecido como IMANI: Center for Humane Education. Seu fundador, Franklin Cudjoe, acredita que “o principal fator que mantém a África atrasada é o enorme déficit de políticas orientadas para o mercado”. Acrescenta que as restrições ao livre comércio estão na base da imensa ineficiência das indústrias sob a proteção do Estado, às custas dos consumidores. Sua organização educa jovens bolsistas em Ghana, sua terra natal, para promover as necessárias mudanças. Cudjoe fala com brutal honestidade sobre o alto índice de corrupção que rouba a poupança dos cidadãos e o capital dos empresários. Os gastos governamentais na África canalizam tanto a ajuda externa quanto as taxas dolarizadas para os que têm boas conexões políticas. Quando os defensores da ajuda estrangeira gritam que a cada três segundos morre uma criança africana de fome ou doença, Cudjoe pergunta: “Você sabe que os governos africanos roubam $4.700 dólares por segundo?”. Quando a empresa aérea holandesa KLM quis começar a voar de países vizinhos para Ghana os funcionários do governo pediram propinas. A empresa desistiu. “As nações ocidentais não fazem isto conosco e a ajuda estrangeira somente mantém este sistema funcionando”, diz Cudjoe. É ainda mais difícil entender quando os paises ocidentais são acusados pelos problemas do Zimbabwe quando seu líder, Robert Mugabe, vive como um príncipe enquanto suas políticas marxistas desperdiçam as parcas riquezas do país. Só no último verão os sequazes de Mugabe deslocaram à força mais de 300.000 pessoas numa campanha contra as empresas privadas e seus oponentes políticos. Centenas de milhares estão tiritando em tendas e barracas, suas casas e seus negócios arrasados. Será que alguém, além de Jesse Jackson (N. T. – Pastor comunista americano, ex-candidato a Presidente pelo Partido Democrata) e Al Sharpton (pastor comunista, ativista, ex-candidato a Presidente pelo mesmo partido) acredita que o que o Zimbabwe precisa é do dinheiro do ocidente? Os defensores do mercado chegaram a uma conclusão famosa expressada nas tiras humorísticas do Pogo: “Encontramos o inimigo e ele somos nós!” Eles entendem que os subsídios podem aplacar a culpa de estrangeiros ingênuos, mesmo que perpetuem as patologias políticas e culturais que criam e sustentem a pobreza que os africanos devem evitar. Avançaram demais e devotaram suas vidas a uma retórica vazia sobre a África. Se há uma razão para esperança na África certamente não vem da loucura ocidental de jogar dinheiro fora mas porque nativos, como Shikwati, Louw, Ayodele e Cudjoe estão clamando ao mundo para que aprendam as dolorosas lições derivadas das políticas passadas.



 

Notas: O título deste artigo é uma homenagem a Antônio Frederico de Castro Alves, o “poeta dos escravos”.

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