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GUARDAS-NOTURNOS

Jacy de Souza Mendonça - 24/05/2020


Designado para atuar, como substituto, em uma pequena Comarca do interior do Estado, as circunstâncias obrigaram-me a pernoitar na cidade. Fiquei, então, muito bem impressionado pelo grande número de guardas-noturnos em atividade, revelado pelos incessantes apitos característicos dessa função. Soube, depois, que isso resultava de eficiente trabalho do Delegado de Polícia local, que organizara e administrava o serviço de vigilância. Os guardas eram remunerados pela contribuição voluntária dos habitantes, satisfeitos com a segurança que o trabalho lhes assegurava.


No pequeno expediente forense, chamou-me a atenção o elevado número de arrombamentos noturnos na cidade, apesar daquela evidente vigilância. Conversando com o Delegado, justificou ele que, na luta contra a organização policial, os delinquentes eram ainda mais bem-organizados.


Recorri, então, à Chefia Geral da Polícia do Estado, onde foi instaurado inquérito, cujo resultado recebi um mês mais tarde, pelo qual ficou demonstrado que os arrombadores eram, na verdade, os identificados por mim e conhecidos da população como guardas-noturnos. Os apitos eram codificados não para afugentar ladrões, mas para informar sobre as regiões onde seria possível roubar, naquele momento, sem qualquer dificuldade, em virtude da ausência de moradores ou de portas e janelas mal fechadas. O butim era dividido entre os pseudo-guardas e correspondia à remuneração deles, pois, embora isso não fosse divulgado, o montante arrecadado dos moradores destinava-se integralmente ao Delegado que, como chefe do bando, o organizara e administrava.


Lembrei-me, então, da lição do genial escritor inglês CHESTERTON no final de seu livro O Homem que foi quinta-feira: “todo policial é um delinquente disfarçado e todo delinquente é um policial disfarçado”.

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