- BBC NEWS BRASIL - 28 Abr, 2021 -
O governo da França condenou uma carta aberta assinada por militares da ativa afirmando que o país está a caminho de uma "guerra civil" por causa do extremismo religioso.

Cerca de 1.000 membros das Forças Armadas, incluindo 20 generais da reserva, assinaram o documento, que culpa "apoiadores fanáticos" por criarem divisões entre comunidades e afirma que islamitas estão tomando conta de regiões inteiras no território francês.
A carta aberta foi publicada uma revista de direita em 21 de abril, data dos 60 anos de um golpe de Estado fracassado no país. "O momento é grave, e a França está em perigo."
Marine Le Pen, líder da extrema-direita na França e candidata na eleição presidencial de 2022, saiu em apoio aos signatários da carta.
Por outro lado, o documento foi duramente criticado por ministros franceses, que apontaram desrespeito à lei e falta de representatividade (as Forças Armadas do país têm mais de 300 mil membros, e milhares de oficiais na reserva).
A ministra responsável pelas Forças Armadas, Florence Parly, afirmou no Twitter: "Dois princípios imutáveis guiam as ações de militares em relação à política: neutralidade e lealdade."
Ela disse também que qualquer signatário da carta que esteja ainda na ativa seria punido por desafiar a lei que determina que militares se mantenham politicamente neutros.
O que diz a carta?
O documento alerta o presidente francês, Emmanuel Macron, seu governo e parlamentares de "diversos perigos mortais" ameaçando a França, incluindo "o islamismo e as hordas dos banlieues", nome dado aos subúrbios de cidades francesas onde vivem muitos imigrantes pobres.
Os signatários da carta aberta culpam um "certo antirracismo" por dividir comunidades e buscarem criar uma "guerra racial" ao atacar estátuas e outros aspectos da histórica francesa.
Eles também acusam o governo Macron de usar a polícia como "intermediários e bodes expiatórios" na repressão brutal dos "gilets jaunes", nome dos manifestantes que usavam coletes amarelos em protestos anti-sistema que tomaram o país a partir de 2018.
"Não é mais hora de adiar, caso contrário amanhã a guerra civil acabará em caos e mortes, pelas quais você será responsável, na casa dos milhares", conclui a carta.
Em um país que paga por vários milhares de ex-oficiais nas listas de aposentados e da reserva, o apoio de apenas 20 deles a uma linguagem tão explosiva exige colocar a carta em perspectiva, diz Hugh Schofield, correspondente da BBC em Paris.
No entanto, o fato de o documento ter sido escrito é um sinal de tempos perigosos, e o apoio de Marine Le Pen significa que os temas continuarão a ressoar no ano de campanha presidencial que está por vir, afirma o jornalista.
Qual foi a reação à carta no país?
Militares franceses, quer estejam na ativa ou na reserva, são proibidos de expressar opiniões públicas sobre religião e política. Por isso, Parly cobrou que aqueles que assinaram a carta sejam punidos.
"Para quem violou o dever de reserva, estão previstas sanções, e se houver soldados ativos entre os signatários, pedi ao chefe do Estado-Maior das Forças Armadas que aplique as regras... Ou seja, sanções", disse a ministra à rede de rádio France Info na segunda-feira (26/4).
Parly citou o caso de um ex-general da Legião Estrangeira que foi expulso do serviço militar por participar de um protesto contra imigrantes em Calais, no norte do país.
Em entrevista à France Info, a ministra da Indústria, Agnès Pannier-Runacher, "condenou sem pensar duas vezes" os generais "que cobram essa revolta... 60 anos depois do golpe dos generais contra o general Charles de Gaulle".
O golpe de Estado fracassado envolveu generais que buscavam impedir a Argélia, então colônia francesa, de conquistar a independência.
A França propôs um projeto polêmico para lidar com o que o presidente Emmanuel Macron descreveu como "separatismo islâmico".
No entanto, alguns críticos na França e em outros países acusaram o governo de ter como alvo o Islã.
Le Pen conclamou generais a se juntarem a ela no que chamou de "Batalha da França", em declaração dada no mesmo dia em que houve um ataque a facas numa delegacia em Paris, que vem sendo tratado como mais um ataque terrorista no país.
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