top of page

Ecos de Miami - Vontade Política e Criminalidade

- HEITOR DE PAOLA - MÍDIA SEM MÁSCARA - 3 DE JUNHO DE 2005 -


Nota Editoria MÍDIA SEM MÁSCARA - Nosso colunista Heitor De Paola esteve em Miami entre os dias 26 e 29 de abril passado, como nosso Correspondente, e por indicação do Dr. Márcio Coimbra de Brasília e da Srª Margaret Tse, do Instituto Liberdade de Porto Alegre e a convite da Atlas Economic Research Foundation. Lá, participou dos seguintes eventos: 5th Annual Atlas Liberty Forum, Manhattan Institute Meeting on Security Policy, Heritage Foundation 28th Annual Resource Bank Meeting e Latin American Health Issues Working Group. Numa série de artigos, dos quais este é o primeiro, ele irá relatar o ocorrido em tais eventos.


ECOS_DE_MIAMI_I_VONTADE_POLÍTICA_E_CRIMINALIDADE
.docx
Download DOCX • 21KB


Muito freqüentemente, os departamentos de polícia trazem vergonha e vexame para as cidades. Suas ações negativas refletem negativamente sobre a cidade, que se torna o foco da atenção nacional e internacional. (...) Chovem acusações de brutalidade, corrupção e incompetência. (...) Ao decidir onde investir, os empresários tomarão decisões baseados, entre outras coisas, na reputação da polícia local. Por isto é importante que o trabalho policial seja bem feito. E esta responsabilidade recai exclusivamente no Chefe de Polícia, que deve desenvolver um trabalho profissional e humano (...) e treinar seus agentes para isto (...) apoiá-los quando cumprem o dever, mesmo que errem – em nossa profissão erros acontecem sempre – (...) mas saber julgar quando está frente ao mau policial – estas pessoas devem ser afastadas definitivamente da profissão JOHN TIMONEY Chefe de Polícia de Miami

Há três anos Miami era um verdadeiro campo de guerra entre quadrilhas, com tiroteios diários principalmente nas áreas centrais. Os investimentos rareavam chegando a cidade a acumular um déficit de oito bilhões de dólares que se tornariam impagáveis, se a fuga de capitais continuasse. Pessoas fugiam em massa para outras localidades menos violentas. Curiosamente, a população mantinha-se a mesma: em torno de 2,2 milhões na área metropolitana (362.470 na City). Numa investigação mais acurada a Administração verificou que os fluxos de saída e entrada se equivaliam em números absolutos, porém saíam ricos e classe média e entravam pobres e miseráveis. Miami é a principal porta de entrada legal e ilegal de imigrantes latinos e caribenhos, na costa Leste. Sua população é das mais mescladas, incluindo cubanos, nicaragüenses, colombianos, venezuelanos, porto-riquenhos, argentinos, equatorianos, brasileiros, dominicanos, haitianos, jamaicanos, mexicanos e nativos das Bahamas. É uma cidade oficialmente bilíngüe e em algumas áreas o francês haitiano também é falado. Com o imenso desemprego provocado pela fuga das empresas, os que chegavam viviam ou do Social Security ou na criminalidade. Tudo muito parecido com as metrópoles brasileiras atualmente, com uma diferença: as quadrilhas eram verdadeiras máfias nacionais – sendo as principais a cubana e a colombiana – e a luta era, portanto, muito mais acirrada do que ocorre aqui.

Em 13 de novembro de 2001, um eleitorado cansado de tanta violência e degradação da cidade elegeu Manny Diaz para Prefeito, acatando suas teses de uma nova forma de administrar a cidade. Nascido em Havana em 1954, aos sete anos fugiu com sua mãe do inferno castrista. Dedicou-se inteiramente à vida empresarial, como advogado, e esta foi a primeira vez que concorreu a um cargo eletivo. Sua administração focou-se na organização da prestação de serviços dentro de uma ideologia empresarial. Criou uma estrutura organizacional do setor privado responsável pela promoção de efetividade e eficiência, enfatizando a responsabilidade e a efetividade como parâmetros para todos os departamentos. Foi assim que no setor de segurança contratou, de comum acordo com o City Manager Carlos Giménez, John Timoney para Chefe de Polícia da Cidade de Miami. Timoney, um imigrante irlandês, começou sua carreira policial como patrulheiro recruta na cidade de New York, tendo atuado muito no Harlem e chegou a Comissário Assistente da Polícia de Nova York, onde foi o principal formulador das reformas da década de 90 que levaram a histórico declínio a criminalidade. Repetiu seu sucesso em Filadélfia, onde serviu como Comissário de 1998 a 2002, quando veio para Miami. Foi considerado America´s Best Cop em 2000. Possui Master Degree em Planejamento Urbano e na Academia de Polícia de NY. Foi o mais jovem “quatro estrelas” em toda a história da Polícia de NY. Recebeu ao longo da carreira 65 medalhas, inclusive a maior de todas, a Medal of Valor. Foi um dos três idealizadores de um novo sistema de rastreamento de dados para a imposição da lei, CompStat. Uma de suas primeiras medidas foi reforçar o treinamento com armas de fogo e as normas de imposição da lei, e equipou seus subordinados com armas não letais. A criminalidade rapidamente baixou 8% (era crescente até então) e as prisões aumentaram em 30% (eram raras antes). O Miami Herald, um ácido crítico da polícia, passou a defender enfaticamente as mudanças no Departamento, que tornou-se exemplar no cumprimento da lei. Durante os primeiros 19 meses nenhum policial usou armas de fogo contra civis e as estatísticas do crime baixaram num ritmo de 10% ao ano. (Dados abaixo). Tais estatísticas foram imediatamente sentidas em Wall Street e as ações do município consideradas junk grade (lixo econômico) desde 1996 - em 2001 já se considerava que a cidade estava fadada à falência -, passaram para a classificação A+ em 2004, o maior índice de toda a história da cidade. Com a revitalização, os investimentos privados atingiram a cifra de 20 bilhões de dólares para projetos de desenvolvimento. Este boom resultou num aumento real de 2,3 bilhões de dólares na arrecadação de impostos e o índice de risco reduziu-se aos mais baixos níveis em meio século, levando ao retorno de residentes de classe média com incremento populacional de 5% nos últimos 4 anos, contrastando com os 7% de aumento de população pobre das últimas três décadas. Inverteu-se o fluxo migratório. Tive o privilégio de assistir à Conferência do Chief Timoney co-patrocinada pela Atlas Foundation e pelo Manhattan Institute, no Breakfast Meeting do dia 28 de abril no Hyatt Regency Hotel de Miami. A conferência se iniciou com uma frase lapidar: “para diminuir expressivamente a criminalidade é, necessário haver vontade política! Esta foi a primeira pergunta que eu fiz ao Prefeito Manny Diaz para decidir se aceitava o posto: há intenção real de combater a criminalidade mesmo enfrentando os riscos políticos? Quando concordou aceitei o cargo e prometi provar que mesmo enfrentando situações politicamente negativas, é possível ser re-eleito! Sim, porque esta é a grande preocupação dos políticos que os impede de atuar decisivamente contra grupos tão poderosos, política e economicamente: agradar a todos para se re-eleger. E ele não me decepcionou, temos trabalhado em conjunto com excelentes resultados”. (É preciso esclarecer que nos EUA é possível a alguém como Timoney oferecer seus serviços como profissional autônomo, cobrar bem por eles, impor suas condições e se não for respeitado pedir o boné – ou o quepe - e dar o fora! Esta tradição vem desde os tempos retratados nos filmes de far-west quem assistiu Gunfight at OK Corral lembra de Wyatt Earp sendo contratado pela população de Tombstone para combater a quadrilha dos Daltons). Esta palestra deveria ser assistida pelas autoridades competentes de nossas metrópoles, pois as medidas tomadas por Timoney não foram nada miraculosas mas bastante simples, baseadas na experiência no combate ao crime e firme decisão de não ceder a demagogias. A primeira medida foi trazer a sua equipe formada ao longo da carreira desde os tempos de New York. Segundo suas próprias palavras, é uma orquestra que toca de ouvido, nem precisa de partituras e totalmente confiável. Sua função inicial era investigar a fundo o próprio Departamento de Polícia. “Quando cheguei aqui me disseram que eu teria que despedir 100% do efetivo policial pois todos eram corruptos. Eu disse que isto era descrer da própria profissão – e eu sinto orgulho de ser um tira (I’m proud to be a cop!). Só pode pensar assim quem não conhece as nobres razões que levam a maioria a escolher esta profissão tão perigosa mas esta maioria vive amedrontada pelos maus policiais que se misturam aos chefes do crime e ameaçam os colegas e suas famílias”. Em três meses cerca de 40% dos efetivos foram demitidos (Nos EUA não existem estas asneiras como Justiça do Trabalho, estabilidade no emprego, indenizações, etc.) por comprovada corrupção. Os bons policiais se deram conta de que tinham alguém do seu lado em quem podiam confiar, começaram a emergir e o pessoal passou a ser remanejado. Todos os Distritos (precincts) foram atingidos, assim como todos os Sub-Departamentos. Outra assertiva de Timoney: “A experiência tem nos demonstrado que mesmo numa cidade do tamanho de Filadélfia o número real de criminosos responsáveis pelo crime organizado não passa de uma centena, por mais que aos olhos do público e dos políticos pareça ser muito mais. Tiroteios constantes, assassinatos, assaltos a toda hora dão a impressão de quadrilhas imensas engajadas no crime. De fato são muito grandes, mas a grande maioria nas áreas pobres se dedica ao crime por coações, que vão desde ameaças pessoais até aos familiares e falta de oportunidades no mercado de trabalho legal. Os verdadeiros bandidos, aqueles que se dedicam de corpo e alma ao crime, incuráveis, são muito poucos”. Timoney ressaltou dois aspectos importantes para liquidar com esta minoria: bom serviço de informação e colaboração do judiciário. Os melhores quadros do Departamento foram empregados na Inteligência dirigida por sua experiente equipe. Como a Justiça de primeira instância é eleita nos EUA a colaboração foi mais fácil, já que os juízes e promotores sentiram a crescente popularidade da polícia, ao mesmo tempo em que decresciam as ameaças às suas pessoas e familiares – antes constantes - e passaram a atuar de forma diversa. Quem era comprovadamente bandido ficava preso e afastado dos comandados. Outro ponto destacado foi a necessidade dos policiais serem bem remunerados e terem segurança para suas famílias: plano de saúde, casa adquirida a juros baixíssimos em áreas boas da cidade, escola garantida para os filhos até a high school, facilidades de compras de artigos de primeira necessidade, garantia de pensão substancial aos cônjuges e manutenção de todos os serviços em caso de morte ou incapacidade. Fundamental é também o fortalecimento do esprit de corps com apoio permanente aos bons policiais e o treinamento para lidar com distúrbios de rua em que se misturam bandidos com cidadãos de bem. Para isto as armas não letais mencionadas acima (bastões de choque elétrico, balas de borracha ou de impacto, etc.) cumpriam o papel fundamental de mostrar à população que não é a polícia o inimigo, mas os bandidos, atraindo sua colaboração passiva de início e ativa posteriormente. A população percebeu que os policiais eram seus aliados e não queriam trucidá-los como antes que já entravam atirando indiscriminadamente e passou a colaborar ativamente. A chegada da polícia na rua de casa não era mais vista como um perigo mas como proteção. “The cop is a public server, not a public killer!”. É claro que pari passu com a revolução no Departamento de Polícia e a Prefeitura a City Mangement Office tomaram medidas importantes para revitalizar a cidade, inclusive seguindo algumas orientações do Chefe Timoney. Miami é hoje uma cidade limpa, segura e sua área central é futurista com seus monotrails automáticos elevados – de utilização gratuita! - se entrecruzando tal qual num filme de ficção científica. Numa conversa informal depois da Conferência perguntei a ele o que achava da campanha de desarmamento em curso Brasil e como ele via a posse de armas pelos cidadãos de bem. Sua resposta foi direta: “O Cidadão de bem armado é o melhor aliado da Polícia”! As lições a serem tiradas nestes dados acima ficam a cargo da reflexão dos leitores mas é sugestivo comparar com as ações tomadas entre nós para acabar com a criminalidade.



 
Heitor De Paola, MSM, em 03 de junho de 2005
16 views0 comments

Related Posts

See All
bottom of page